A ucraniana Maryna Viazovska é a segunda mulher a receber a Medalha Fields (equivalente ao prêmio Nobel na área de Matemática) desde o início da premiação, em 1936. A medalha, associada a um prêmio em dinheiro, é concedida a cada quatro anos para dois a quatro pesquisadores de menos de 40 anos, responsáveis por “feitos excepcionais na área de matemática.
Nascida em 1984 em Kiev, capital da Ucrânia, quando o país ainda era parte da União Soviética, hoje Maryna é professora na Escola Politécnica Federal de Lausanne, Suíça, onde leciona desde 2017. A estudiosa solucionou um problema geométrico que permanecia sem resposta há muitos séculos: provou que certa solução que já era conhecida para o empacotamento de esferas em oito dimensões é a mais densa possível.
Os especialistas se referiram à solução apontada por ela para a questão como “simples”, “elegante” e “inesperada”. “Viazovska é uma matemática brilhante”, disse Christian Blohmann à BBC News Mundo, o serviço em espanhol da BBC.
Blohmann, que é pesquisador do Instituto Max Planck de Matemática, na Alemanha, refere-se ao fato de que, em 2016, Maryna resolveu dois casos do famoso problema geométrico que o grande cientista alemão Johannes Kepler (1571-1630) propôs em 1611.
“Como resultado da resolução de Viazovska, nos últimos cinco anos foram abertas linhas de pesquisa em diferentes partes do mundo”, disse Pablo Hidalgo à BBC, pesquisador do Instituto de Ciências Matemáticas do Conselho Superior de Pesquisa Científica da Espanha.
A Medalha Fields não havia sido concedida a uma mulher até muito recentemente. Foi apenas em 2014 que a matemática iraniana Maryam Mirzakhani recebeu a honraria. Infelizmente, ela morreu três anos mais tarde, aos 40 anos, depois de uma batalha contra um câncer de mama.
“É fundamental que mulheres matemáticas sejam reconhecidas, porque além de merecerem, servem de modelo para as meninas. As mulheres matemáticas acabam tendo seus trabalhos desvalorizados e suas conquistas ofuscadas. Maryna Viazovska poderia ter ganhado uma medalha Fields em 2018, pois já tinha provado seu principal resultado”, diz Christina Brech, professora do Instituto de Matemática e Estatística da USP.
O matemático grego Euclides é uma das inspirações de Maryna, que afirma admirar as figuras que foram capazes de “mudar a Matemática ou a forma de pensar sobre ela”. Fascinada pelos números desde criança, para ela, a Matemática possibilita determinar onde está “a verdade” e distinguir o que está errado do que está certo. Depois de se formar na Universidade Nacional Taras Shevchenko, ela foi para a Alemanha cursar pós-graduação. Durante seu pós-doutorado em Berlim, um dos problemas que incluiu em sua proposta de pesquisa foi o das esferas de Kepler.
O problema levantado por Kepler pode ser simplificado na questão “qual é a melhor forma de dispor bolas de certo tamanho, fixadas numa caixa muito grande, para que caiba a maior quantidade possível delas?” A pergunta pode parecer simples, mas exige uma matemática de alta complexidade para ser resolvida. Foi um longo caminho desde que os primeiros feirantes agruparam laranjas em formato de pirâmide e um matemático americano, Thomas Hales, em 1990, fez uma demonstração desse empacotamento para três dimensões. Maryna conseguiu um modo de empacotar as esferas em oito dimensões.
A matemática Erica Klarreich escreveu em um artigo da revista Quanta, de 2016, que esse empacotamento de esferas está relacionado “aos códigos de correção de erros que os telefones celulares, as sondas espaciais e a internet usam para enviar sinais através de canais ruidosos”.
Segundo estudiosos da área, a solução matemática encontrada por Thomas “foi muito longa e muito complicada”. Seu resultado foi apresentado em cerca de 250 páginas. Maryna resolveu a questão em um artigo de 25 páginas (incluindo referências bibliográficas).
“A ciência é um esforço colaborativo, e o progresso rápido é possível quando as pessoas compartilham abertamente seus conhecimentos e ideias”, disse Maryna ao receber uma de suas muitas premiações.